O COROLÁRIO DAS JARARACAS
13.1.24
11.1.24
20.2.21
3.3.10
Texto achado num poste duma rua de Sao Paulo
Em 2001, andando pelas ruas de São Paulo, em Higienópolis, encontrei umas folhas escritas à mão pregadas num poste:
"São Paulo, 10 de maio de 2001.
Meu nome é Marthia Pasquali de Yema, mas todos me chamam de Márcia
rg nr. 7.896.691-0. Nasci no Rio de Janeiro, Leme em 13 do 5 de
1949.
Me criei em São Paulo, na Bela Vista, Rui Barbosa. Eu, Márcia,
morava na Barão de Tatuí, 493, na pensão do seu Salvador Donatelle
Sposito em um quarto e cozinha por mais de 12 anos, onde em julho e
agosto de 1998, eu Márcia fui vítima de assassinato.
Furaram as paredes do meu quarto, com furadeira e puseram gás dentro
do meu quarto através dos furos. Eu não morri, o gás era gelado,
parece que misturado com tintas usadas por o genro do seu Salvador.
Eles
todos dentro da pensão, em um quarto cedido por seu Salvador, em
cima perto do quarto que era da dona Francisca Rosa que morreu.
Colocaram uma câmera da TV Globo enfiada em um buraco da parede
do meu quarto, eu os ouvia muito bem tudo que falavam. O Saulo
Kankrest, seus irmãos gêmeos, Pinna Rosse Savio, Alberto Klogen
Filho, Alberto Klegen pai. Dr. Vila Lobos, Dr. Fido Chao, meu
ex-marido
Ricardo Ismael Yena, as inquilinas.
Foi então que colocaram uma antena parabólica no muro da pensão
perto do meu quarto e colocaram gás, veneno da índia, gas atômico
nuclear. Diz o Saulo que foi a Mariele Saraiva Leão que colocou
ferros da máfia chinesa nos meus pés e corpo. Só sei que meu pé
inchou muito. Aquele gás maligno entrou no meu corpo, na minha alma,
ser.
A dor difícil de defini-la. Dei um grito de dor, pedindo ajuda, mas
ninguém me ajudou. Enquanto isso eu tentava salvar minha vida com
água que Deus me deu. A idéia de jogar água sobre meu corpo. Peguei
meu baldo verde, peguei água do tanque da Edite e joguei água sobre
meu corpo.
Coloquei a cabeça sob a torneira do tanque. Enquanto eles diziam, Ô
Saulo, aumenta a dose. Os outros, Mata! Mata! Mata!, dizia o Dr.
Villa-lobos, mata essa desgraçada que ela passou Aids prá mim. Sendo
que quem deve ter aids é ele. Embaixo das axilas cheias de caroços.
Eu
transei sim com Villa-lobos, no Hotel dna Viridiana, com camisinha.
Já estava a 14 anos sem transar com ninguém.
Eu, Márcia, não tenho aids, não tenhão câncer, não tenho doença
nenhuma. E sim eles. E elas. Não sou bicha, não sou guey, não sou
sapatona, não sou redenvu, não sou tracatoeira(???). Sou fêmea, mãe
de dois filhos.
Transei com este pastor maligno que eu não sabia que era pastor por
obra e graça do satanás, gente deles. O gás ficou saindo da antena
semana, dias. Após eu mudar de lá continuou saindo e a camera
filmando toda pensão. Seu Salvador Donatelle todos os dias via o gás
saindo da antena. À noite ele aumentava a dose. Entrava todo dentro
do meu corpo e dentro do meu quarto também continuava cada vez mais
a sair pelos furos da parede. O Alberto Hegeu Pai falou ao Saulo
cuidado ela é muito inteligente.
Foi então que eu falei Quem está aí? Falei o nome de cada um e
perguntei por que queria me matar. O Saulo falou: Ela descobriu tudo
e agora?
Abaixo, um fac-semile de uma das folhas:
Esta é a foto da autora do texto, Marthia.
Segundo informações do Blog INFODINÂMICO, depois que tentaram matá-la, tal ela descreve acima, Marthia foi morar nas ruas.
Hoje em dia é conhecida como a Xuxinha de Higienópolis, mas isso é uma descrição popular sarcástica, na verdade, ela é uma grande poetisa e uma pop star incompreendida.
A começar pelo nome.
"São Paulo, 10 de maio de 2001.
Meu nome é Marthia Pasquali de Yema, mas todos me chamam de Márcia
rg nr. 7.896.691-0. Nasci no Rio de Janeiro, Leme em 13 do 5 de
1949.
Me criei em São Paulo, na Bela Vista, Rui Barbosa. Eu, Márcia,
morava na Barão de Tatuí, 493, na pensão do seu Salvador Donatelle
Sposito em um quarto e cozinha por mais de 12 anos, onde em julho e
agosto de 1998, eu Márcia fui vítima de assassinato.
Furaram as paredes do meu quarto, com furadeira e puseram gás dentro
do meu quarto através dos furos. Eu não morri, o gás era gelado,
parece que misturado com tintas usadas por o genro do seu Salvador.
Eles
todos dentro da pensão, em um quarto cedido por seu Salvador, em
cima perto do quarto que era da dona Francisca Rosa que morreu.
Colocaram uma câmera da TV Globo enfiada em um buraco da parede
do meu quarto, eu os ouvia muito bem tudo que falavam. O Saulo
Kankrest, seus irmãos gêmeos, Pinna Rosse Savio, Alberto Klogen
Filho, Alberto Klegen pai. Dr. Vila Lobos, Dr. Fido Chao, meu
ex-marido
Ricardo Ismael Yena, as inquilinas.
Foi então que colocaram uma antena parabólica no muro da pensão
perto do meu quarto e colocaram gás, veneno da índia, gas atômico
nuclear. Diz o Saulo que foi a Mariele Saraiva Leão que colocou
ferros da máfia chinesa nos meus pés e corpo. Só sei que meu pé
inchou muito. Aquele gás maligno entrou no meu corpo, na minha alma,
ser.
A dor difícil de defini-la. Dei um grito de dor, pedindo ajuda, mas
ninguém me ajudou. Enquanto isso eu tentava salvar minha vida com
água que Deus me deu. A idéia de jogar água sobre meu corpo. Peguei
meu baldo verde, peguei água do tanque da Edite e joguei água sobre
meu corpo.
Coloquei a cabeça sob a torneira do tanque. Enquanto eles diziam, Ô
Saulo, aumenta a dose. Os outros, Mata! Mata! Mata!, dizia o Dr.
Villa-lobos, mata essa desgraçada que ela passou Aids prá mim. Sendo
que quem deve ter aids é ele. Embaixo das axilas cheias de caroços.
Eu
transei sim com Villa-lobos, no Hotel dna Viridiana, com camisinha.
Já estava a 14 anos sem transar com ninguém.
Eu, Márcia, não tenho aids, não tenhão câncer, não tenho doença
nenhuma. E sim eles. E elas. Não sou bicha, não sou guey, não sou
sapatona, não sou redenvu, não sou tracatoeira(???). Sou fêmea, mãe
de dois filhos.
Transei com este pastor maligno que eu não sabia que era pastor por
obra e graça do satanás, gente deles. O gás ficou saindo da antena
semana, dias. Após eu mudar de lá continuou saindo e a camera
filmando toda pensão. Seu Salvador Donatelle todos os dias via o gás
saindo da antena. À noite ele aumentava a dose. Entrava todo dentro
do meu corpo e dentro do meu quarto também continuava cada vez mais
a sair pelos furos da parede. O Alberto Hegeu Pai falou ao Saulo
cuidado ela é muito inteligente.
Foi então que eu falei Quem está aí? Falei o nome de cada um e
perguntei por que queria me matar. O Saulo falou: Ela descobriu tudo
e agora?
Abaixo, um fac-semile de uma das folhas:
Esta é a foto da autora do texto, Marthia.
Segundo informações do Blog INFODINÂMICO, depois que tentaram matá-la, tal ela descreve acima, Marthia foi morar nas ruas.
Hoje em dia é conhecida como a Xuxinha de Higienópolis, mas isso é uma descrição popular sarcástica, na verdade, ela é uma grande poetisa e uma pop star incompreendida.
A começar pelo nome.
2.3.10
O menino que comia lápis
O cu do mundo onde eu nasci, era uma vila operária em Floripa, que
foi construída basicamente pra abrigar os operários da construção do
aeroporto local e as estradas que a ele levariam. Meu avô, que era
pescador no interior da ilha, mudou-se pra ali, achando isso um
grande avanço na vida, pois teve acesso a uma casa na cidade e ficou
pagando mil réis da hipoteca pelo resto da vida.
Meus pais foram morar juntos com meus avós. Formávamos uma família
apinhocada num moquifo, mas aparentemente feliz.
Junto da nossa família haviam outras famílias, cada uma com sua
sina. Bem em frente, morava um velho que havia trabalhado na estrada
e no aeroporto com meu avô. Ele tinha uma esposa desdentada, que
falava uma língua incompreensível. Achavámos que era uma bruxa,
certamente. O filho deles, um menino que era
proibido de sair de casa, vivia trancafiado sob o jugo e loucura dos
dois.
Nós crianças, sabíamos várias histórias arrepiantes sobre eles e
também como a velha poderia rogar pragas. Por isso nem nos
aproximávamos muito da casa. Mas mesmo assim, sabíamos que Nicolau,
o menino daquela casa, pela falta de brinquedos, amigos e mesmo
alimento, tinha ratos como bichos de estimação e comia lápis.
E era verdade. Fomos capazes uma vez de espiar pela janela e vê-lo
com um lápis na boca; outra vez o vimos guardando pedaços de papéis
numa caixa de sapatos; da terceira vez quase fomos pegos pela velha
e para evitar uma praga maligna, resolvemos nunca mais tentar. Já
tínhamos provas suficientes de que ele mantinha ratos em um ninho de
papel dentro de uma caixa de sapato e que comia lápis.
E depois também era fácil vê-los pela rua quando iam fazer compras.
Naquela época não existiam sacolas, as pessoas traziam tudo nas mãos
e, podemos confirmar: lápis. Nunca o vimos com nenhum brinquedo.
Enquanto alguém era presenteado com uma pistola automática da Atma,
o outro com um jogo de botão da Estrela, o menino do outro lado da
rua ganhava lápis.
A velha era mesmo louca, alimentar a criança com lápis. E nós,
crianças, nos perguntávamos, será que era por isso os cabelos pretos
e os olhos negros do Nicolau?
Nossa infância foi de tardes em tardes de bola de gude, de julhos em
julhos de pandorgas, de verões a invernos de baderna. Nicolau
passava tudo isso trancado no seu quarto, comendo lápis e fazendo
ninhos com pedaços de papel na caixa pro seus ratinhos, ergh!
Chegou então o dia que o velho morreu. Foi quase na mesma época que
também morreu meu avô. Aqueles homens traziam no corpo todo o peso
das pedras que carregaram e furaram com os próprios dedos. Passavam
por cima deles agora todo o peso dos carros que passaram sobre a
estrada que eles construíram. Suas almas eram pistas de pouso de um
cansaço imenso pelo trabalho no aeroporto. Até hoje a estrada está
lá, pois sua fisiologia de asfalto se reconstitui ano
após ano, mas os homens que a construiram, se foram e estão
esquecidos.
Assim que o velho morreu, parece que as coisas pioraram naquela
casa. Nós já éramos quase adolescentes. Naquela época, com 14 anos
ainda se era meio criança, mas podíamos entender com clareza que a
velha havia adoecido terrivelmente. A casa virou um estacionamento
de ambulâncias e a única coisa que não mudava era Nicolau e o lápis
na boca. Não sabíamos bem o que se passava lá dentro, só sabíamos
que logo a velha iria morrer.
No último dia, quando ela foi para o hospital, vieram uns homens
para ver Nicolau. Nós todos sentados no muro vimos também chegar uma
ambulância que apesar de branca, não parecia uma daquelas
ambulâncias comuns. Alguém falou que deveria ser do manicômio. De
dentro dela saiu uma senhora gorda e loira. Entrou na casa com
sacolas e horas depois saiu com Nicolau pelo braço e o levava para a
ambulância.
Corremos todos para ver de perto. Pela primeira vez podíamos olhar
Nicolau bem de perto. Pela primeira vez o vimos vestido completo,
com meias e sapato e, inclusive, camisa. Ele olhou a cada um de nós
com seus olhos profundamente pretos, de tanto comer grafite, o
coitado. E talvez por aquele grafite no olhar, estava tão claramente
escrito que Nicolau ia para nunca mais voltar. Nós não sabíamos para
onde, mas ele também não.
Mas com certeza, onde quer que aquela ambulância o levasse, iria ser
melhor pra ele do que aquela prisão onde que ele vivia. Mas será que
ele iria ser acostumar com brinquedos de verdade? Será que não iria
sentir saudades dos seus ratos? Será que ele iria se acostumar a
comer pão, em vez de lápis de madeira e carbono? Será que ele iria
para escola e aprenderia que lápis era para escrever. Será que ele
não iria comer a borracha de sobremesa? Alguém até brincou e todos
rimos quando a ambulância se afastou. Mas era um riso oco.
A ambulância foi embora e nunca mais voltou com as respostas sobre
Nicolau. A casa ficou vazia e nós também.
Duas semanas depois a velha voltou do hospital. Eu estava indo pra
escola quando a porta da sua casa se abre, ela aparece e me chama.
Meu primeiro impulso foi sair correndo, mas ela insistiu saindo
trôpega à porta.
Ela me levou para dentro da casa e me dirigiu ao quarto de Nicolau.
Ao entrar naquela casa lúgubre, que nunca havia visto luz, fiquei
pensando no que aquela velha queria de mim. Senti medo. Será que
Nicolau havia voltado e estava de molho, depois de uma surra
estendido num canto, como antigamente?
Entrei no quarto dele e estava vazio. Não havia uma cama, sabíamos
que ele dormia no sofá da sala. Só havia um guarda roupa velho e,
num canto, os lápis, pedaços de papel e uma caixinha ao lado. Será
que aquela velha pensava que eu iria querer aqueles lápis todos com
a ponta mastigada?
Ela me indicou a caixinha e percebi que ela queria que eu cuidasse
dos ratos dele. Mas isso era demais! Eu daria aqueles ratos ao
primeiro gato que visse.
Quando me aproximei pra apanhar e olhar a caixa, fui percebendo que
os lápis eram tocos minúsculos, na verdade com uma extremidade
mordida, mas a outra bem apontada e com sinais de gastos e não
comidos, como acreditávamos.
Quando abri a caixa, me preparando até pro cheiro horrivel de
possíveis ratos mortos, vi que dentro dela não haviam ratos. Mas
muitas folhas pequenas de papel. E estes papéis estavam todos
escritos. E eram poemas. Muitos poemas. Nicolau não criava ratos
nojentos como pensávamos, Nicolau escrevia poemas. Nicolau não era
louco, era poeta.
A velha fez com que eu apanhasse a caixa e me fosse. Com a mesma
vassoura que iria varrer os lápis e os restos de pontas, ela foi me
espantando da casa, típico de bruxa. Antes que ela me rogasse alguma
praga, eu saí.
Passei dois dias lendo os poemas do Nicolau. Dois dias depois a
velha morreria. Guardei os poemas dele até hoje.
Pra encerrar este relato, um poema de Nicolau Flores. Na minha
opinião não é o melhor dele, mas é aquele que as pessoas geralmente
mais gostam:
foi construída basicamente pra abrigar os operários da construção do
aeroporto local e as estradas que a ele levariam. Meu avô, que era
pescador no interior da ilha, mudou-se pra ali, achando isso um
grande avanço na vida, pois teve acesso a uma casa na cidade e ficou
pagando mil réis da hipoteca pelo resto da vida.
Meus pais foram morar juntos com meus avós. Formávamos uma família
apinhocada num moquifo, mas aparentemente feliz.
Junto da nossa família haviam outras famílias, cada uma com sua
sina. Bem em frente, morava um velho que havia trabalhado na estrada
e no aeroporto com meu avô. Ele tinha uma esposa desdentada, que
falava uma língua incompreensível. Achavámos que era uma bruxa,
certamente. O filho deles, um menino que era
proibido de sair de casa, vivia trancafiado sob o jugo e loucura dos
dois.
Nós crianças, sabíamos várias histórias arrepiantes sobre eles e
também como a velha poderia rogar pragas. Por isso nem nos
aproximávamos muito da casa. Mas mesmo assim, sabíamos que Nicolau,
o menino daquela casa, pela falta de brinquedos, amigos e mesmo
alimento, tinha ratos como bichos de estimação e comia lápis.
E era verdade. Fomos capazes uma vez de espiar pela janela e vê-lo
com um lápis na boca; outra vez o vimos guardando pedaços de papéis
numa caixa de sapatos; da terceira vez quase fomos pegos pela velha
e para evitar uma praga maligna, resolvemos nunca mais tentar. Já
tínhamos provas suficientes de que ele mantinha ratos em um ninho de
papel dentro de uma caixa de sapato e que comia lápis.
E depois também era fácil vê-los pela rua quando iam fazer compras.
Naquela época não existiam sacolas, as pessoas traziam tudo nas mãos
e, podemos confirmar: lápis. Nunca o vimos com nenhum brinquedo.
Enquanto alguém era presenteado com uma pistola automática da Atma,
o outro com um jogo de botão da Estrela, o menino do outro lado da
rua ganhava lápis.
A velha era mesmo louca, alimentar a criança com lápis. E nós,
crianças, nos perguntávamos, será que era por isso os cabelos pretos
e os olhos negros do Nicolau?
Nossa infância foi de tardes em tardes de bola de gude, de julhos em
julhos de pandorgas, de verões a invernos de baderna. Nicolau
passava tudo isso trancado no seu quarto, comendo lápis e fazendo
ninhos com pedaços de papel na caixa pro seus ratinhos, ergh!
Chegou então o dia que o velho morreu. Foi quase na mesma época que
também morreu meu avô. Aqueles homens traziam no corpo todo o peso
das pedras que carregaram e furaram com os próprios dedos. Passavam
por cima deles agora todo o peso dos carros que passaram sobre a
estrada que eles construíram. Suas almas eram pistas de pouso de um
cansaço imenso pelo trabalho no aeroporto. Até hoje a estrada está
lá, pois sua fisiologia de asfalto se reconstitui ano
após ano, mas os homens que a construiram, se foram e estão
esquecidos.
Assim que o velho morreu, parece que as coisas pioraram naquela
casa. Nós já éramos quase adolescentes. Naquela época, com 14 anos
ainda se era meio criança, mas podíamos entender com clareza que a
velha havia adoecido terrivelmente. A casa virou um estacionamento
de ambulâncias e a única coisa que não mudava era Nicolau e o lápis
na boca. Não sabíamos bem o que se passava lá dentro, só sabíamos
que logo a velha iria morrer.
No último dia, quando ela foi para o hospital, vieram uns homens
para ver Nicolau. Nós todos sentados no muro vimos também chegar uma
ambulância que apesar de branca, não parecia uma daquelas
ambulâncias comuns. Alguém falou que deveria ser do manicômio. De
dentro dela saiu uma senhora gorda e loira. Entrou na casa com
sacolas e horas depois saiu com Nicolau pelo braço e o levava para a
ambulância.
Corremos todos para ver de perto. Pela primeira vez podíamos olhar
Nicolau bem de perto. Pela primeira vez o vimos vestido completo,
com meias e sapato e, inclusive, camisa. Ele olhou a cada um de nós
com seus olhos profundamente pretos, de tanto comer grafite, o
coitado. E talvez por aquele grafite no olhar, estava tão claramente
escrito que Nicolau ia para nunca mais voltar. Nós não sabíamos para
onde, mas ele também não.
Mas com certeza, onde quer que aquela ambulância o levasse, iria ser
melhor pra ele do que aquela prisão onde que ele vivia. Mas será que
ele iria ser acostumar com brinquedos de verdade? Será que não iria
sentir saudades dos seus ratos? Será que ele iria se acostumar a
comer pão, em vez de lápis de madeira e carbono? Será que ele iria
para escola e aprenderia que lápis era para escrever. Será que ele
não iria comer a borracha de sobremesa? Alguém até brincou e todos
rimos quando a ambulância se afastou. Mas era um riso oco.
A ambulância foi embora e nunca mais voltou com as respostas sobre
Nicolau. A casa ficou vazia e nós também.
Duas semanas depois a velha voltou do hospital. Eu estava indo pra
escola quando a porta da sua casa se abre, ela aparece e me chama.
Meu primeiro impulso foi sair correndo, mas ela insistiu saindo
trôpega à porta.
Ela me levou para dentro da casa e me dirigiu ao quarto de Nicolau.
Ao entrar naquela casa lúgubre, que nunca havia visto luz, fiquei
pensando no que aquela velha queria de mim. Senti medo. Será que
Nicolau havia voltado e estava de molho, depois de uma surra
estendido num canto, como antigamente?
Entrei no quarto dele e estava vazio. Não havia uma cama, sabíamos
que ele dormia no sofá da sala. Só havia um guarda roupa velho e,
num canto, os lápis, pedaços de papel e uma caixinha ao lado. Será
que aquela velha pensava que eu iria querer aqueles lápis todos com
a ponta mastigada?
Ela me indicou a caixinha e percebi que ela queria que eu cuidasse
dos ratos dele. Mas isso era demais! Eu daria aqueles ratos ao
primeiro gato que visse.
Quando me aproximei pra apanhar e olhar a caixa, fui percebendo que
os lápis eram tocos minúsculos, na verdade com uma extremidade
mordida, mas a outra bem apontada e com sinais de gastos e não
comidos, como acreditávamos.
Quando abri a caixa, me preparando até pro cheiro horrivel de
possíveis ratos mortos, vi que dentro dela não haviam ratos. Mas
muitas folhas pequenas de papel. E estes papéis estavam todos
escritos. E eram poemas. Muitos poemas. Nicolau não criava ratos
nojentos como pensávamos, Nicolau escrevia poemas. Nicolau não era
louco, era poeta.
A velha fez com que eu apanhasse a caixa e me fosse. Com a mesma
vassoura que iria varrer os lápis e os restos de pontas, ela foi me
espantando da casa, típico de bruxa. Antes que ela me rogasse alguma
praga, eu saí.
Passei dois dias lendo os poemas do Nicolau. Dois dias depois a
velha morreria. Guardei os poemas dele até hoje.
Pra encerrar este relato, um poema de Nicolau Flores. Na minha
opinião não é o melhor dele, mas é aquele que as pessoas geralmente
mais gostam:
11.2.10
WebCam
Com a aquisição de um minilaptop com webcam, adicionei mais uma a minha já tão grande coleção.
A vantagem dessa é que ela será móvel e sairá às ruas, quando o inverno acabar.
Coletânea de mais de 2mil fotos reunidas numa animação de uma câmera posta no sótão e algum tratamento na imagem:
É sempre interessante poder gravar os momentos e ir acumulando-os em arquivos.
A vantagem dessa é que ela será móvel e sairá às ruas, quando o inverno acabar.
Coletânea de mais de 2mil fotos reunidas numa animação de uma câmera posta no sótão e algum tratamento na imagem:
É sempre interessante poder gravar os momentos e ir acumulando-os em arquivos.
Se você gosta de dar uma espiadinha na vida de um blogueiro, ponha seu olho no escritório, perto do computador e aproveita pra bisbilhotar.
Aqui a imagem atualizada da camera 1:
e aqui a da câmera dois:
E aqui mais uma, no laptop:
Aqui a imagem atualizada da camera 1:
e aqui a da câmera dois:
E aqui mais uma, no laptop:
Arquivos:
9.2.10
A vida virtual
Ao lado da vida normal e natural que levamos, existe uma outra vida.
Uma vida virtual. Esta vida como qualquer outra, tem um corpo. Um
corpo cibernético. É igual a qualquer corpo, tem suas doenças, a
começar por vírus.
Virus e Espamos, ou spam. Esses são os males que mais afetam o corpo
digital, hoje em dia.
Se eu pudesse tornar realidade toda esta virtualidade que me vêm no
spam, minha vida seria diferente: se eu ganhasse dinheiro de todos
os e-mails de NIGERIAN SCAMMERS que recebo, hoje estaria na lista
dos mais ricos do mundo, e não escrevendo esta coluna, mas
na minha cobertura em Tokyo comendo sushi com saquê.
Se eu comprasse todas as maravilhosas ofertas de viagra que recebo,
estaria eternamente de pau duro e fazendo amor infinitamente.
Se eu adquirisse todas as ofertas mágicas de crescimento de pênis,
precisaria de uma empresa de guindaste para carregar meu membro, que
seria gigantesco.
Se eu refletisse seriamente sobre todas as mensagens sobre amizade
que recebo diariamente, seria a pessoa mais piegas e melosa da face
da terra.
Eu ganharia todo dia na loteria e seria convidado por dezenas de
mocinhas pra fazer sexo selvagem.
Mas nada disso é verdade. A única verdade é minha inocente conexão
atolada de bytes indesejados.
---
Mas algo mesmo chato que eu vejo acontecer frequentemente na minha vida virtual, vem justamente dos meus amigos.
Aqueles que costumam enviar arquivos pps, ou links pra toda a sua lista, com os emails todos no campo visível.
São muito lindinhos e engraçadinhos seus emails, mas geralmente cometem um grave pecado internético, pois submetem todos os amigos da sua lista a virus cibernéticos.
Parece que a maioria ainda não sabe que não se envia emails com todos os endereços aparentes no
campo PARA. É preciso usar o campo cópia carbono, ou CC, ou escondido, ou seja lá que nome tenha onça.
Em uma lista pública, se algum dos amiguinhos estiver infectado de algum virus, é bem capaz que o virus colete o endereço dos outros e assim se distribuindo.
Além disso, divulgando toda a sua listas de endereços tambem pode ser um atentado à privacidade de alguns. Talvez alguém, por alguma razão, não queira aparecer na lista ou que seu nome seja divulgado a outros.
Além do mais sempre há o perigo que alguns dos amigos desta lista tenha um blog, e tenha a mania de responder a toda a lista com o link do seu blog.
Uma vida virtual. Esta vida como qualquer outra, tem um corpo. Um
corpo cibernético. É igual a qualquer corpo, tem suas doenças, a
começar por vírus.
Virus e Espamos, ou spam. Esses são os males que mais afetam o corpo
digital, hoje em dia.
Se eu pudesse tornar realidade toda esta virtualidade que me vêm no
spam, minha vida seria diferente: se eu ganhasse dinheiro de todos
os e-mails de NIGERIAN SCAMMERS que recebo, hoje estaria na lista
dos mais ricos do mundo, e não escrevendo esta coluna, mas
na minha cobertura em Tokyo comendo sushi com saquê.
Se eu comprasse todas as maravilhosas ofertas de viagra que recebo,
estaria eternamente de pau duro e fazendo amor infinitamente.
Se eu adquirisse todas as ofertas mágicas de crescimento de pênis,
precisaria de uma empresa de guindaste para carregar meu membro, que
seria gigantesco.
Se eu refletisse seriamente sobre todas as mensagens sobre amizade
que recebo diariamente, seria a pessoa mais piegas e melosa da face
da terra.
Eu ganharia todo dia na loteria e seria convidado por dezenas de
mocinhas pra fazer sexo selvagem.
Mas nada disso é verdade. A única verdade é minha inocente conexão
atolada de bytes indesejados.
---
Mas algo mesmo chato que eu vejo acontecer frequentemente na minha vida virtual, vem justamente dos meus amigos.
Aqueles que costumam enviar arquivos pps, ou links pra toda a sua lista, com os emails todos no campo visível.
São muito lindinhos e engraçadinhos seus emails, mas geralmente cometem um grave pecado internético, pois submetem todos os amigos da sua lista a virus cibernéticos.
Parece que a maioria ainda não sabe que não se envia emails com todos os endereços aparentes no
campo PARA. É preciso usar o campo cópia carbono, ou CC, ou escondido, ou seja lá que nome tenha onça.
Em uma lista pública, se algum dos amiguinhos estiver infectado de algum virus, é bem capaz que o virus colete o endereço dos outros e assim se distribuindo.
Além disso, divulgando toda a sua listas de endereços tambem pode ser um atentado à privacidade de alguns. Talvez alguém, por alguma razão, não queira aparecer na lista ou que seu nome seja divulgado a outros.
Além do mais sempre há o perigo que alguns dos amigos desta lista tenha um blog, e tenha a mania de responder a toda a lista com o link do seu blog.
20.1.10
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